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Robert Redford e o Fim de Uma Era

  • tribunaporto
  • 20 de set.
  • 3 min de leitura

Robert Redford faleceu no dia 16 de setembro deste ano, aos 89 anos de idade. Para quem nasceu até a década de 1980, possivelmente seja dispensável a sua apresentação. Porém, para quem nasceu a partir da década de 1990, talvez seja necessário dizer que se trata de um dos mais consagrados atores do cinema estadunidense, tendo protagonizado filmes como Butch Cassidy (contracenando com Paul Newman); Gente como a Gente (pelo qual ganhou um Oscar); Todos os Homens do Presidente (contracenando com Dustin Hoffman); Jeremiah Johnson (conhecido no Brasil como Mais Forte que a Vingança) e Jogo de Espiões (em que contracenou com Brad Pitt).


Muita gente nova usa como figurinha de WhatsApp (tipo gif) ou meme a imagem de Redford em Jeremiah Johnson: um homem com espessa barba, cabelo relativamente longo e que, num cenário bucólico, acena com a cabeça afirmativamente. Provavelmente, poucas dessas pessoas que utilizam essa figurinha sabem disso.


No dia 5 de setembro, faleceu Sílvio Tendler. Esse, possivelmente, me nos conhecido ainda, pois foi diretor de cinema brasileiro, o que, costumeiramente, chama a atenção apenas dos cinéfilos. Tendler produziu documentários excepcionais, muitos deles voltados para a História do Brasil, como Jango (1984); Os Anos JK – Uma Trajetória Política (1980) e o seriado de TV Anos Rebeldes (1992).


No dia 13, foi a vez do multi-instrumentista Hermeto Pascoal nos deixar. Alguém talvez se lembre de Caetano Veloso citá-lo na música Podres Poderes: “Será que apenas os hermetismos pascoais... nos salvam, nos salvarão dessas trevas e nada mais...”.


Hermeto era um músico excepcional, dotado do tipo de talento que não se replica, aquela coisa que somente os gênios possuem, como as pernas tortas de um Garrincha confundindo os adversários com seus dribles ou os passos leves e saltitantes, quase uma dança, de Mohammad Ali no tablado do boxe. A intenção deste texto não era ser necrológico e nem ao menos um libelo à morte. Porém, a reflexão que se faz é a de que a morte física dessas pessoas representa, em certa medida, o fechamento de um ciclo, de uma era. Se pararmos para pensar – e eu fiz esse exercício – no quanto de referências da cultura pop ou de massa (que é a que mais nos  atinge enquanto público) presentes até a década de 1980 deixaram de existir sem deixar memória, nos últimos anos, ficaremos surpresos.


 Os historiadores como Eric Hobsbawm e Pierre Nora já debateram sobre esse assunto em outras perspectivas, como a sensação de um presente contínuo sem a existência de um passado ou a aceleração da História. O volume de informação (e esses autores falaram ainda no século XX!) que recebemos é de tal tamanho que se torna impossível manter uma conexão com o que ocorreu há apenas alguns anos. Daí o fato de que, quando perguntamos a um jovem se ele conhece os Beatles, recebermos muitas vezes a resposta: não é do meu tempo.


Quem nasceu até a década de 1980 viveu outra sensação de passagem do tempo, com menor aceleração e maior captação (ou melhor, uma captação com maior profundidade) das informações geradas nas décadas anteriores.


Eu não nasci na década de 1940 e, nem por isso, desconheço a atuação de atores como Oscarito, Grande Otelo e Mazzaroppi. Ou de cantores e grupos musicais como Buddy Holly and The Crickets; Bill Haley and His Comets ou Alvarenga e Ranchinho.


Isso me fez lembrar uma situação ocorrida. Um amigo de trabalho, no ano 2000, me disse que estava “irado” porque o Fábio Júnior (cantor) ha via “estragado” a música “20 e poucos anos” dos Raimundos. Eu comecei a rir e disse: “A música é do Fábio Júnior. Ele gravou no final da década de 1970”. Meu amigo ficou incrédulo. Naquele tempo não havia smartphones para conferirmos as informações. Mesmo os bus cadores, como o Google, tinham apenas dois anos de existência. Ele só se convenceu quando outras pessoas, mais velhas do que eu, confirmaram a minha fala.


A perda da conexão com o passado é comparável à dor de um peso coletivo porquanto simboliza a descontinuidade da tradição (no sentido de trânsito entre uma geração e outra). Essas mortes citadas aqui (e haveria tantas outras) representam o fim de uma era porque, provavelmente, se não houver uma ação de nossa parte, serão personalidades esquecidas daqui há poucos anos. Independentemente da contribuição cultural que deram à humanidade.


Carlos Carvalho Cavalheiro é professor, mestre em educação, escritor, pesquisador e colaborador da TRIBUNA

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